No entanto, a realidade das favelas fala alto. Impulsionado pelo aumento do custo de vida e do desemprego, o Brasil viu um aumento de 40% na população vivendo em favelas, para 16 milhões nos últimos 12 anos, de acordo com o censo de 2022. Isso é agravado por um aumento sem precedentes na porcentagem de pessoas vivendo em extrema pobreza em 48,2% entre 2020 e 2021, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Esses são os tipos de problemas estruturais que não podem ser resolvidos apenas pela tecnologia, de acordo com David Nemer, professor da Universidade da Virgínia e antropólogo que estudou tecnologia em favelas. “O projeto Favela 3D é inovador porque tem uma visão holística”, diz Nemer. Não é “impulsionar uma agenda de solucionismo tecnológico”, mas construir infraestrutura e serviços e, em seguida, colocar a tecnologia no topo.
A parte digital do plano 3D começa com acesso confiável e acessível à internet, que muitas vezes falta nas favelas. As operadoras não querem investir em infraestrutura para conectar linhas fixas, e os planos de dados móveis são caros para quem ganha muito pouco.
A Gerando Falcões trabalhou com a empresa de internet banda larga VIP Telecom, a integradora de tecnologia FiberX e a Huawei para conectar a favela em Ferraz de Vasconcelos usando 15 unidades Wi-Fi colocadas em locais estratégicos dentro da comunidade. O sinal é distribuído por roteadores que podem atingir velocidades de até 9,6 gigabits por segundo.
A conectividade não é suficiente por si só para trazer as pessoas para a economia digital. Por exemplo, as casas em favelas muitas vezes não possuem um número ou código postal, e suas localizações podem ser inseguras ou de difícil acesso, o que significa que as entregas nas favelas são desaprovadas pela maioria das empresas de logística tradicionais. Isso significa que os moradores das favelas geralmente contam com amigos ou familiares que moram em moradias convencionais para receber compras online. Segundo dados do instituto de pesquisa Instituto Locomotiva, 70% dos moradores de favelas desistem de comprar online por causa de barreiras na entrega.
Como solução para esse problema estrutural, Gerando Falcões fez parceria com Google e naPorta para criar endereços digitais de código aberto, gratuitos e integrados ao Google Maps. Para localizar endereços usando “plus codes”, a tecnologia converte as coordenadas de latitude e longitude do GPS em códigos alfanuméricos, que são colocados na frente de cada residência.
No projeto Favela 3D, os pedidos de comércio eletrônico são direcionados para um contêiner na própria favela. Operado pelo naPorta, o hub coordenado por da Silva, os itens são entregues por correios locais aos moradores de bicicleta. As organizações se envolvem com empresas de comércio eletrônico e varejistas para criar campanhas destinadas a incentivar o consumo online na favela.
No entanto, Nemer sugere que conectar a favela ao comércio eletrônico pode não significar necessariamente empoderamento. “Se estamos conseguindo (os moradores da favela) comprar de empresas bem estabelecidas e sem compromisso com o território, estamos tirando recursos de suas comunidades. Significa que estamos apostando no desenvolvimento social por meio do consumismo, o que é problemático porque não ‘não significa necessariamente progresso ou inclusão”, diz ele.
Outras empresas de tecnologia chegaram à favela Dreams como parte do projeto Favela 3D. A Coletando, fintech que faz pagamentos digitais a pessoas em troca de materiais recicláveis, se instalou na área. Fleury, uma empresa de assistência médica, estabeleceu uma instalação de telemedicina.